sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Em memória do saudoso Professor Rinaldo Cardoso Ferreira

Por Roberto Burkhardt* 

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Rinaldo Cardoso Ferreira: líder, engajado e amigo

por Ricardo de Almeida*

Comecei a conviver com Rinaldo no longínquo ano de 1980. Na ocasião, ele era o coordenador do Centro de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão da Faculdade de Ciências da Administração de Pernambuco, pertencente à Fundação de Ensino Superior de Pernambuco (FCAP/FESP), hoje Universidade de Pernambuco (UPE). 

Sob seu comando, a pós-graduação da FCAP já era reconhecida pela qualidade dos seus cursos. Mas era preciso desenvolver a Pesquisa e a Extensão para consolidar o potencial técnico e científico da Faculdade. 

Eu e Sérgio Buarque fomos convidados para dividir essa tarefa com ele. Sérgio assumiu a Pesquisa e a Extensão ficou sob minha responsabilidade, tudo com a supervisão de Rinaldo. 

Para enfrentar o desafio de tornar a FCAP uma instituição relevante e socialmente legitimada era preciso trazer para o centro da Instituição os problemas reais da sociedade. 

Estruturamos a Extensão em três grandes eixos: Extensão Universitária, Extensão Cultural e Assistência Técnica. 

Na Extensão Universitária desenvolvemos um conjunto de seminários, sendo um dos mais relevantes o “Seminário Internacional sobre Disparidade Regional” quando reunimos durante cinco dias, 24 especialistas do Brasil e da Itália para fazer um estudo comparativo entre o Nordeste do Brasil e o Mezzogiorno da Itália. Também nessa área, realizamos várias publicações e cursos de curta duração com os melhores quadros do Brasil e do exterior. Para isso, fizemos parcerias com instituições da França, da Itália, da Alemanha e da Venezuela por exemplo. 

Na Extensão Cultural um bom exemplo foram as exibições de cinema, sempre seguidas de debates. Entre tantos filmes pessoalmente selecionados por nós, destaco “Tempos Modernos”, de Charlie Chaplin, cuja exibição foi seguida de um debate sobre as mudanças nos processos de trabalho decorrentes da evolução tecnológica. 

No campo da Assistência Técnica, mobilizamos um conjunto de estudantes do nosso quadro e experientes profissionais do mercado, e desenvolvemos dezenas de trabalhos de consultoria para instituições públicas e privadas. 

Fico feliz de, ao lado de Rinaldo e de outros dedicados docentes e técnicos, ter contribuído para a história e para o prestígio da FCAP. 

Mas Rinaldo não era só FCAP. Em 1986, Jarbas Vasconcelos foi o primeiro prefeito eleito do Recife pelo voto popular, depois do obscurantismo do Regime Militar. E Rinaldo foi convocado para a Diretoria de Administração e Finanças da então Empresa de Urbanização do Recife (URB), junto com o engenheiro Jaime Gusmão, que assumiu a presidência daquela empresa pública tão importante para a cidade. 

Também aí, tive o privilégio de servir junto com ele, e coordenei um grande processo de adequação e planejamento estratégico da instituição. 

Toda essa jornada profissional nos fez desenvolver uma amizade pessoal. Durante anos, cultivamos o hábito de pelo menos um “almoço de fim de ano”, sempre regado com boa conversa e esperança de dias melhores. 

Esse é o Rinaldo com quem convivi: líder, engajado e amigo. 

Descanse em paz! 

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Rinaldo Cardoso Ferreira, uma pessoa especial

Rinaldo Cardoso Ferreira, uma pessoa especial

Por Mércia Santos

É com imensa saudade que hoje escrevo esse texto, para homenagear meu sogro, Professor Rinaldo Cardoso Ferreira, que recebeu outras homenagens em vida e fez sua passagem em 24 de junho de 2024.

Nos reunimos nessa celebração para lembrar e valorizar essa pessoa tão especial. Quem amamos sempre estará em nossos corações, independente da presença física. Este é um momento de grande emoção, de olhar para trás e refletir sobre todo convívio, momentos, afeto e amor recebidos, e o aprendizado ao longo dessa jornada.

Ainda lembro o dia que conheci Prof. Rinaldo Cardoso, ou Sr. Rinaldo como eu o chamava. Nesse dia já senti a pessoa atenciosa, afetuosa, carinhosa, educada e um pai amoroso que era.

Dividimos ao longo desses 30 anos de convivência alguns amores muito especiais, por Rinaldo, Paula, pelo querido Santa Cruz e pela universidade pública.

Ao longo desses anos, aprendi com ele um pouco sobre política, nacional e internacional. Também sobre a importância da educação na mudança da vida das pessoas e das pessoas que contribuíram para construção de uma história de lutas e consequentes mudanças na vida da sociedade.

Aproveito este momento para agradecer a todos aqueles que valorizam e reconhecem toda dedicação de Sr. Rinaldo ao trabalho e as lutas da Universidade de Pernambuco (UPE), notadamente ao trabalho do Sindicato de Professores (ADUPE) desta instituição. Agradeço imensamente a todos que estiveram ao lado dele nessas lutas.  Estou segura de que o legado dele contribuiu para formação de muitos profissionais, desde os professores e funcionários da UFPE e ADUPE, até a família, amigos e colegas de turma.

Por fim, agradeço a oportunidade de ter convivido com Sr. Rinaldo e me sinto muito privilegiada de ter recebido tanto amor, juntamente com minha filha Paula e meu esposo Rinaldo Luiz.

Com amor e saudades.

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Rinaldo Cardoso: Exemplar Mestre Agregador

 

Por Mauro Ferreira Lima

Não me foi difícil escrever sobre nosso inesquecível colega e amigo Rinaldo. Tudo nele era tão explícito que, o que tenho de recordações da minha convivência com este profissional e amigo, aqui me flui fortemente.

Seu semblante transmitia sempre uma leve e perene aura de tranquilidade, paz e serenidade.

Rinaldo foi uma pessoa grandiosa e marcante até pela sua sobriedade. Leitor Voraz, acumulou um universo de conhecimentos amplos e plurais que partilhava prazerosamente com colegas e amigos do seu ampliado entorno.

Assim escrevo porque fiz parte desse seu profícuo e caloroso entorno.

Face a isso, escrever sobre esse grande amigo e colega de ensino superior, que já partiu, é um exercício de estímulo à minha memória transbordante de profunda saudade.

Ele não era apenas uma presença edificante nas salas de aulas. Nos corredores da Faculdade de Administração da UPE era sempre prazeroso encontrá-lo.

Era um companheiro de jornada sempre disposto a chegar junto aos que o cercavam. Compartilhou sempre a sólida base cultural que acumulou durante anos e anos de incursão e estada no vasto e complexo campo do conhecimento.

Carregava consigo uma formidável e única sabedoria, não apenas obtida nas centenas e centenas de livros que teve acesso, mas na vivência de um cotidiano pleno de ensinamentos.

Era aprendiz contumaz e encarava a vida como fonte de solidificação e avanço deste seu característico traço de personalidade.

Seus gestos de solidariedade para os que com ele conviveram, era um traço explícito do seu modo de ser. Era o tipo de pessoa que se podia contar para aliviar desafios e dramas pessoais, mas, também para desfrutar de constantes momentos de alegrias e desconcentração no cotidiano universitário.

Lembrar dele traz à tona projetos desenvolvidos em conjunto e horas de estudos de artigos e textos que selecionávamos para análise e discussão.

Afinal, de cada episódio de estudo partilhado comemorávamos as conquistas e os avanços obtidos. Reforçava, assim, seu dom de tornar os momentos acadêmicos sempre mais leves e descontraídos.

Mesmo após sua partida, continua vivo nas estórias, nas lembranças e no legado que deixou em cada um de nós. Seu impacto vai além do que Conseguimos dele usufruir. Deixou uma marca nas nossas vidas e, por isso, será sempre lembrado com carinho e gratidão.

Por último, aqui resumo, em apenas uma palavra, o que Rinaldo representou para os que com ele conviveram: companheiro MAGNÂNIMO

! SEMPRE!!!

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Rinaldo Cardoso Ferreira: professor, mestre e militante

Por Edval Cajá*

Epígrafe

Os senhores da terra e os senhores do capital sempre usarão seus privilégios políticos na defesa e perpetuação de seus monopólios ... Conquistar o poder político tornou-se, por tanto, o grande dever das classes trabalhadoras... Um elemento para o sucesso elas possuem - são maioria; mas a maioria numérica só pesa na balança se unificada pelo grupo e conduzida pelo conhecimento.
(Karl Marx - A doutrina da libertação da classe trabalhadora, Edições Manoel Lisboa, Recife, 2019).

Rinaldo Cardoso Ferreira é recifense da gema, nasceu numa família proletária, no dia 24 de maio de 1935, no bairro de São José, onde também nasceram o Batutas de São José e o Galo da Madrugada, os mais tradicionais blocos de carnaval do Recife. Enquanto seu pai dirigia caminhões de entrega da Souza Cruz, por longas décadas, sua mãe dedicava-se ao penoso e invisível trabalho de cuidar da casa e da família. Rinaldo casou-se em 1958, com Maria do Monte Sinai Caraciolo Ferreira, dessa união nasceram Liliane, Rinaldo Luíz e Lígia. Em 1991, realizou seu segundo casamento com Carol (Maria Carolina Bezerra Cavalcanti). Rinaldo foi historiador (1965) e economista (1971), as duas graduações foram na renomada Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP), retornando àquela instituição como professor de economia, em 1972, já um professor de concepção marxista da história, chegando a exercer, inclusive, a coordenação do departamento dos cursos de economia e administração.

Estrada da vida

Antes de se consagrar como professor universitário, ele também trabalhou no Banco Nacional do Norte (BANORTE), na Texaco, Banco do Brasil, e lecionou história em colégios do Recife.
Rinaldo concluiu seu mestrado, em 1986, na UFPB, com uma primorosa dissertação “O Movimento de Cultura Popular de Recife - MCP - expressão educacional de uma proposta política de mudanças”. Rinaldo queria compreender a efervescente situação político-cultural na qual vivera a sua juventude, aqueles agitados e esperançosos anos que antecederam o golpe militar fascista de 1º de abril de 1964.

Ele tinha uma verdadeira paixão por aquele ambiente propício para o despertar de novas consciências, marcado pela ação dos governos municipais progressistas de Pelópidas Silveira (1955-1959) e Miguel Arraes (1960-1963) e do governo do Estado (31/01/63 a 02/04/1964) promovendo o Movimento de Cultura Popular (MCP), o Teatro Popular do Nordeste (TPN), o Ateliê Coletivo, com aulas regulares, incentivando as artes plásticas, a literatura, a música, a dança, o Cinema Novo. Para isso, foram construídos prédios-cineteatro no centro da cidade e nos maiores bairros, como Boa Vista, Casa Amarela, Afogados, entre outros, sempre lotados com exibições, espetáculos, assembleias populares, ou congressos, festivais e encontros locais e regionais, com esta motivação, tendo à frente, as figuras históricas da cidade, como Anita Paes Barreto, Abelardo da Hora, Germano Coelho, Paulo Rosas, Hermilo Borba Filho, Leda Alves, Iran Pereira, Naide Teodósio, Josué de Castro, Paulo Freire e seu famoso método de alfabetização e educação de adultos nos bairros populares de Recife.

Militância

Era comum Rinaldo se emocionar ao demonstrar a ideologia revolucionária dos comunistas voltando a contagiar o movimento de massas no final dos anos 50 e início dos anos 60, na cidade do Recife, como também em Jaboatão, Olinda, São Lourenço da Mata, Palmares e Caruaru, especialmente de sua juventude, seus intelectuais de formação marxista e políticos do campo da esquerda, como Amaro Quintas, Waldomiro Cavalcanti, Manoel Correia de Andrade, Paulo Cavalcanti, Miguel Arraes e Francisco Julião das Ligas Camponesas do Brasil, que estimulavam seu povo, a orgulhar-se das tradições de rebeldia e insurreições de seus ancestrais, desde Zumbi dos Palmares, passando por Gregório Bezerra, Amaro Luiz de Carvalho, entre outros.

Numa rode de conversa sobre o comunismo científico e seus fundadores Karl Marx e Friedrich Engels, no Centro Cultural Manoel Lisboa, há 30 anos atrás, aproximadamente, Rinaldo nos falou, com um orgulho danado, de ter se tornado comunista de forma natural. Como, assim, companheiro? Ele respondeu: “Ora, em Recife, no início dos anos 60, foi grande o impacto da revolução cubana de 1º de janeiro de 1959, a gigantesca desigualdade social reinante em Pernambuco e muitos livros publicados, a preço popular, objetivando despertar a consciência política dos jovens, dos trabalhadores, sobre a realidade social na qual se vivia, como as coleções Romances do Povo e Cadernos do Povo, tendo alguns destes chegado a vender cerca de um milhão de exemplares. Tudo isso tornava o socialismo e o comunismo algo próximo de nós”.

Construção

Rinaldo foi se fazendo militante: “Ler A Concepção Materialista da História, de George Plekhanov e a Contribuição à Crítica da Economia Política, de Marx, logo ao chegar à universidade, significou uma redescoberta do mundo, da sociedade e da possibilidade de transformá-la”. Assim ele se expressou, maravilhado com a teoria marxista.

A sua longeva amizade com a direção do PCR e com o professor Waldomiro Cavalcanti, na Universidade Católica (Unicap), o levou a estudar praticamente toda a obra de Marx, especialmente O Capital. A sua consciência passou a exigir coerência entre teoria e prática. Como transformar a sociedade capitalista em sociedade socialista sem a organização e a militância da classe trabalhadora, sem sua vinculação orgânica com a teoria e o movimento comunista? Estas grandes indagações o levaram a envolver-se na luta concreta contra a ditadura militar e pelo socialismo. Assim, procurou cuidadosamente aliar sua confortável atividade profissional de professor universitário com a realização de tarefas da resistência armada clandestina à ditadura. Dois exemplos concretos, relatados a seguir, são suficientes para comprovar o tamanho do seu compromisso e de sua capacidade. Ele tinha plena consciência do risco que corria, seja pela ameaça de um flagrante da Polícia do Exército (PE), a patrulha de choque do Exército, seja pela possibilidade de uma delação arrancada nas câmeras de torturas, no que pese sua grande confiança na formação ideológica dos militantes do Partido e na política de segurança do Partido, no caso de prisão

 Tributo

Estas linhas representam um tributo à memória do companheiro Rinaldo. Com elas, pensando na publicação de um livreto, pelas edições Manoel Lisboa, iniciaremos a coleta de testemunhos por escrito de amigos, colegas de magistério e ex-alunos que queiram contribuir com a construção da memória histórica deste combatente da luta pela derrubada da ditadura, pela conquista anistia, pela punição dos torturadores e golpistas de 1964, pela liberdade e pelo socialismo.

Companheiro Rinaldo! Presente, agora e sempre!

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Rinaldo Cardoso deixou na Universidade de Pernambuco marcas de expressões que só quem tem compromisso com a dimensão ética, social e política consegue deixar

Por Maria Auxiliadora Leal Campos

Não sei porque, tenho hábito de vincular meus sentimentos às experiências de pessoas que conseguiram existir no seu verdadeiro sentido da palavra, o de sair de si. Rinaldo Cardoso deixou na Universidade de Pernambuco marcas de expressões que só quem tem compromisso com a dimensão ética, social e política consegue deixar. É por essas marcas que mexem com os meus sentimentos e de muitas outras pessoas que também foram tocadas por seu testemunho, que precisamos nos empenhar em não deixar que sua existência seja esquecida e sua luta ignorada.

 Há duas formas de fazer memória de uma pessoa: uma é a nostálgica, a outra é memória audaz que retoma o legado deixado e se revive para hoje. Em se tratando de Rinaldo, cabe as duas formas nas nossas memórias, destacando a sua amorosidade, tanto como amigo, quanto como militante.

Tenho certeza que, muitos dos que fazem a UPE não conhecem sua trajetória, muito menos as pessoas que se envolveram até transformar a antiga FESP na Universidade de Pernambuco. Por isso, advogo a necessidade de se promover meios, como este evento, que possibilitem, especialmente para aqueles que entraram na instituição recentemente, conhecer para gostar e se motivar em “vestir sua camisa” e dar continuidade ao processo de luta. Afinal, ainda temos muito o que crescer.

  No ano de 1990, ainda quando FESP, Rinaldo procurou unificar os Professores, que, naquele momento, atuavam em Unidades espalhadas no interior e na capital e tinham formas de trabalho e salários diferenciados. Nessa luta, motivou-se em criar e presidir a ADUFESP,  considerando que, concomitante à reorganização do sistema interno, precisava articular a mobilização para junto ao Governo do Estado avançar para atingir a meta de transformar a Fundação na primeira Universidade Pública de Pernambuco.

 Em 1993, na Unidade de Garanhuns, foi discutido e formalizado o Projeto de carreira dos Professores. Ou seja, havia preocupação em caminhar com a reestruturação interna da FESP, no sentido de fazer avançar o processo político para se tornar Universidade.

Em 1995, consolidado o processo de Universidade, a ADUFESP transformou-se em ADUPE. A luta foi intensa em mobilizar as entidades representativas da nova Universidade, daí foi organizado o Fórum UPE, do qual integravam as representações dos segmentos dos Docentes, Servidores Técnicos-Administrativos e alunos (ADUPE, SINDUPE e DCE) para discutir o estatuto da UPE.

Diante de suas realizações, posso dizer que Rinaldo Cardoso foi e continua sendo inspiração por meio de suas qualidades e de seus atos, que continua transmitindo força, segurança e determinação que conseguem resistir nas suas memórias. Essa capacidade de lidar com desafios, abalos e mudanças foi fulcral para deixar as necessárias marcas na história da Universidade de Pernambuco.

 Rinaldo! Presente, presente, presente...

Auxiliadora Campos é docente do Campus UPE Mata Norte e foi presidente da Adupe

segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Rinaldo, o criador de oportunidades

Prof. Sérgio Buarque

Existem certos momentos na vida em que determinados eventos podem abrir caminhos favoráveis ou, ao contrário, criar obstáculos que podem atrapalhar o nosso futuro. No meio destes eventos, encontramos também amigos que geram oportunidades que mudam as nossas trajetórias intelectuais e profissionais e estimulam o desenvolvimento pessoal. Eu tive muitos destes amigos que, na minha atribulada vida, ajudaram na abertura de oportunidades. Rinaldo Cardoso foi um dos amigos mais importantes na minha trajetória profissional em um momento muito particular da vida, quando acabava de chegar ao Recife de volta de quase sete anos de exílio. No primeiro ano da minha reinserção intelectual e profissional, trabalhei como editor internacional no Jornal do Commercio, porque na Alemanha tinha me tornado jornalista, e ajudei a fundar o Centro de Estudos e Pesquisas Josué de Castro, como um espaço de produção e reflexão intelectual sobre o Nordeste e o Brasil, porque tinha ambição de ser pesquisador e formulador de políticas. 

No final de 1980, sai do Jornal e não tinha conseguido financiamento para nenhuma pesquisa do Centro Josué de Castro na minha área de interesse e atuação.  Financeiramente me apoiava em Ester, minha mulher que mais abriu meu destino no Brasil após o exílio, inclusive me levando a fazer o mestrado de Sociologia. Neste momento, Rinaldo abriu as portas para a entrada na Universidade quando me convidou para ser professor de economia na Faculdade de Administração da antiga FESP (atual UPE), onde ele era professor e figura influente e muito respeitada. Um gesto de enorme confiança, uma vez que estava, há vários anos, afastado das teorias econômicas e nem sequer tinha o mestrado concluído. Minha história acadêmica e profissional tinha sido bem caótica, mas parece que Rinaldo vislumbrou neste caos um potencial e apostou seu prestígio na indicação para o cargo de professor. Meu maior desafio naquele momento era corresponder à confiança demonstrada por Rinaldo.

Como criador de oportunidades, Rinaldo foi mais longe no meu envolvimento na FCAP, me encaminhando para assumir a Coordenação de Pesquisa da Faculdade ao mesmo tempo em que levou nosso amigo comum, Ricardo de Almeida, para a Coordenação de Extensão, formando um trio afinado e complementar, Ricardo, o próprio Rinaldo e eu. Em pouco mais de quatro anos, promovemos uma grande agitação intelectual na FCAP, avançando na realização de pesquisas inovadoras, captando financiamento de instituições nacionais e internacionais, e gerando estudos numa área muito nova no Brasil, de Política de Ciência e Tecnologia. A Coordenação de Extensão complementava a agitação com a realização de grandes eventos intelectuais, como o Seminário Internacional sobre Disparidade Regional, e atraindo pesquisadores da Europa e da América Latina além de brasileiros renomados, para apoiar a nossa produção e os debates.

Foi uma festa intelectual, acadêmica e política, promovendo debates sobre temas atuais e relevantes. Numa metáfora futebolística, podemos dizer que Ricardo era uma espécie de centroavante, o cara que ia na linha de frente como o operador de resultados e eu era um meio-campista que preparava as jogadas e alimentava o atacante. E Rinaldo? Rinaldo era o capitão do time, a figura que apoiava as iniciativas mais ousadas. E era também o mais político dos três. E Mesmo depois que, por diversas razões, o trio se dissolveu, cada um seguindo caminhos diferentes, Rinaldo continuou sendo o criador de oportunidades. 

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Lembranças e aprendizados deixados pelo Professor Rinaldo Cardoso Ferreira

Por Bernadete Perez, Maurílio Pedrosa e Tiago Feitosa 

Um processo de mudança pode sempre começar aqui e agora na defesa da Universidade pública, gratuita e de qualidade. As mudanças que precisamos na sociedade também é tarefa da Universidade, que não vai exercer sua função social com legitimidade e hegemonia se a vida, a saúde, a garantia dos direitos humanos, o bem estar social não forem plenamente exercidos. Essas ideias aprendemos enquanto estudantes e presidentes do Diretório Central de Estudantes Prof. Paulo Freire, da Universidade de Pernambuco - DCE-UPE, durante o convívio com Professor Rinaldo Cardoso na ADUPE. Atento às nossas posições, falas, ideias, solidário em todos os momentos - nunca tivemos no convívio em nossas três gestões do DCE nenhuma fala desrespeitosa, aumento do tom, gritos ou posturas autoritárias - teve uma relação com o movimento estudantil de coerência ético-política.

Professor Rinaldo ouvia, atento, nossas falas e aprendemos com ele, na nossa relação de parceria na ADUPE e com tantos professores de referência como Dôra, Itamar, Veranice entre tantas e tantos, a nos questionar se a paridade no processo eleitoral nunca seria possível, se estaríamos fadados à uma reforma administrativa iniciada na gestão do governador Jarbas Vasconcelos que desencadearia uma demissão em massa com claro objetivo de privatização da UPE ou se o desinvestimento orçamentário e financeiro seriam inexoráveis. Juntos, dissemos não! Fizemos passeatas gigantes com muita mobilização, potente articulação política entre os diversos segmentos da comunidade universitária, interinstitucional e com movimentos sociais organizados. Conseguimos a gratuidade, a paridade, parar a reforma administrativa. Estávamos certos e a UPE cresceu, ficou mais forte, ainda que aquém do que a comunidade universitária e sociedade pernambucana mereçam. Mostramos que é possível movimento solidário e coletivo em torno do comum, ainda que com lugares e pessoas diferentes, nos juntamos em torno de eleições para diretores e reitores progressistas, com compromisso político com a comunidade acadêmica e com a sociedade mais justa. Defendemos juntos os hospitais universitários e o caráter público e universal do SUS.

Professor Rinaldo foi forte defensor da interiorização da Universidade, defendia levar novos cursos, dinamizar e investir fortemente nas unidades no interior. Viu a potência na interiorização da UPE e apontava a necessidade de fortalecer institucionalmente. Foi pioneiro na organização do movimento docente e articulou com movimento docente nacional, defendia a liderança da UPE diante dos desafios nacionais e locais. Defendeu a democratização dos espaços representativos da Universidade e foi um articulador dos três segmentos, fazendo questão de incluir técnicos e estudantes nas pautas antes tomadas como exclusivas ou dominadas por docentes, mas que acreditava na força da atuação conjunta em torno de grandes temas em defesa da Universidade Pública. Sobre a gratuidade, foi intransigente.

Aprendemos que o debate sobre a mudança é mais que necessário e atual, para recuperarmos a vontade dos indivíduos, grupos e coletividades, de maneira a compor sujeitos para construir novos projetos. Projetos críticos e alternativos ao senso comum, ao pessimismo, à descrença, à falta de investimentos públicos na educação, à privatização de tudo na vida, da água, saneamento básico, escolas, rede de saúde, praças públicas, modalidades de discursos e práticas atualmente dominantes e hegemônicas no contexto atual. A UPE ainda não está protegida e valorizada como a gente, ele, todas e todos queríamos, mas resistimos e insurgimos na defesa cotidiana da educação pública e de qualidade.

Se apostamos que as grandes transformações depende sempre do desejo, de uma vontade de mudança, de alterar a realidade, de uma dimensão subjetiva juntamente com o domínio de várias formas de ciência, de um projeto conscientemente produzido vinculado ao exercício da razão, professor Rinaldo continua presente!

Se acreditamos que é possível e desejável experimentar novos modos de dirigir organizações, questionar os micropoderes nas instituições públicas, no hospital, nas Universidades, nas gestões dos serviços negando o determinismo absoluto do geral sobre o particular, negando a idealização de só ter sentido se for tudo ao mesmo tempo, tampouco o pessimismo do nada, professor Rinaldo está presente!

Se buscamos viver desejando com coeficientes maiores de liberdade, autonomia, justiça, democracia, saúde, solidariedade e prosseguimos enquanto sujeitos sociais, professor Rinaldo está presente!

E ainda, na vigência real de todos esses impasses que temos enfrentado na política na gestão urbana, na crise ambiental e civilizatória no Brasil e no mundo e alguém  de nós acreditar na possibilidade de mudanças, de reformas ou de revoluções com sentido humano e democrático, professor Rinaldo estará presente!

Lamentamos imensamente a perda e seguiremos na resistência criativa e potente do movimento coletivo, de reinvenção da vida, da afirmação da solidariedade, do reencantamento com o concreto. O movimento é inacabado e permanece na Universidade de Pernambuco, na rede, nas pessoas, noutros lugares, na possibilidade criada em gerar novas utopias e conectando a educação, a formação e as políticas públicas com todas as outras lutas na busca da democracia. As pessoas que admiramos, que nos afetam e com quem partilhamos a vida nas alegrias, tristezas, esperanças e riscos ficam gravadas como a imagem única em movimentos que nunca se repetem, mas que deixam lembranças e apostas em torno do presente e de um futuro cheio de utopias possíveis!

Professor Rinaldo Cardoso: presente!

*Bernadete Perez - gestão DCE 99/2000

*Maurílio Pedrosa - gestão DCE 97/98

*Tiago Feitosa - gestão DCE 95/96

(Ex-presidentes do Diretório Central dos Estudantes Prof. Paulo Freire, da Universidade de Pernambuco)

Rinaldo Cardoso Ferreira: seu legado de lutas em defesa do ensino público e de qualidade é e sempre será inspiração

Por Ana Brito*

Quando, em 1982, ingressei no quadro de docentes do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Ciências Médicas, lecionando a disciplina de Gastroenterologia, tive a grata satisfação de fazer parte do coletivo de professores das outras unidades educacionais da então Fundação de Ensino Superior de Pernambuco (FESP), mantenedora de faculdades pré-existentes no Estado. Foi nessa época que conheci o professor Rinaldo Cardoso Ferreira, da Faculdade de Administração e de Direito, e uma das principais lideranças do movimento em favor do fortalecimento e organização dos docentes. Ele foi idealizador, nos anos 1980, da criação da Associação dos Docentes da FESP (ADUFESP), posteriormente transformada em Seção Sindical dos Docentes da Universidade de Pernambuco (ADUPE), sendo seu primeiro Presidente e tendo-a dirigido em outras ocasiões. Sempre pautou sua luta em favor do ensino e da docência, com espírito combativo e altruísta.

O professor Rinaldo também desempenhou um papel crucial e pioneiro na luta pela criação da Universidade de Pernambuco (UPE), tornando-a a primeira e, até o momento, única universidade pública estadual (Lei Estadual nº 10.518, de 29 de novembro de 1990). Também foi com sua liderança, a partir da ADUFESP, que foi instituída a Carreira Docente na instituição. Hoje, a UPE é um patrimônio da sociedade pernambucana e mantém a missão de contribuir para o desenvolvimento sustentável do nosso Estado por meio do ensino, da pesquisa e da extensão universitária. Importante lembrar, ainda, que a UPE tem no seu DNA as digitais do saudoso amigo Rinaldo Cardoso, que se encantou no último dia 24 de junho de 2024.

Um colega cordial, um homem público democrata, um professor competente e afeito ao diálogo. Assim, posso resumir o professor Rinaldo Cardoso Ferreira. Acrescento, ainda, seu legado de lutas em defesa do ensino público e de qualidade, inspirando, até hoje, pessoas que continuam atuando com os ideais de igualdade e pela justiça social. Seu nome está inscrito na História de Pernambuco. Descanse em paz, amigo!

Recife, 10 de julho de 2024

 *Ana Brito, Profa Adjunta da FCM/UPE